Operação Marquês: ex-secretária admite que recebeu dinheiro de Sócrates através do motorista

Maria João Santos afirmou, em tribunal, que entregas ocorreram exclusivamente na sua casa em Azeitão e não, como indiciam intercepções telefónicas, na sede do PS, no Largo do Rato, em Lisboa.

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José Sócrates, de 68 anos, está pronunciado (acusado após instrução) por 22 crimes FILIPE AMORIM/EPA
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Uma ex-secretária de José Sócrates admitiu nesta terça-feira, no julgamento do processo Operação Marquês, que o antigo primeiro-ministro lhe chegou a pagar os serviços prestados em numerário, esclarecendo que o dinheiro foi entregue pelo motorista João Perna.

Segundo Maria João Santos, a prestação informal de serviços aconteceu em 2013, depois de o chefe de Governo entre 2005 e 2011 ter regressado de Paris e ter pedido à secretária, funcionária do Partido Socialista (PS), para meter uma licença sem vencimento. “Nunca tive nenhum contrato com José Sócrates. [...] Se eu não tenho um contrato, no fundo, ele está a dar-me uma ajuda pelos serviços que estou a prestar de secretariado”, afirmou a secretária, precisando que era João Perna quem lhe entregava o dinheiro.

Maria João Santos acrescentou que as entregas ocorreram exclusivamente na sua casa, em Azeitão, concelho de Setúbal, e não também, como indiciam intercepções telefónicas, na sede do PS, no Largo do Rato, em Lisboa.

José Sócrates, de 68 anos, está pronunciado (acusado após instrução) por 22 crimes, incluindo três de corrupção, por ter, alegadamente, recebido dinheiro para beneficiar, em dossiers distintos, o grupo Lena, do Grupo Espírito Santo (GES) e do resort algarvio de Vale do Lobo.

O Ministério Público considera que os montantes terão sido recebidos com recurso a testas-de-ferro e parcialmente distribuídos em numerário por pessoas da esfera do antigo primeiro-ministro. No total, o processo conta com 21 arguidos, que têm, em geral, negado a prática dos 117 crimes económico-financeiros que lhes são imputados.

João Perna, de 56 anos, é um destes arguidos e responde por um crime de branqueamento de capitais. O julgamento decorre desde 3 de Julho no Tribunal Central Criminal de Lisboa e tem sessões agendadas pelo menos até 18 de Dezembro.

Campos e Cunha desmente Sócrates: PM queria Vara na CGD

Luís Campos e Cunha, um dos ministros das Finanças de José Sócrates, assegurou nesta terça-feira em tribunal que o antigo primeiro-ministro insistiu “desde o início” que Armando Vara fosse nomeado para a administração da Caixa Geral de Depósitos (CGD), desmentindo o que Sócrates disse numa sessão anterior. “Isso é mentira. (...) Eu nunca indiquei Armando Vara para lugar nenhum”, assegurou no dia 4 de Setembro, garantindo que o nome do antigo secretário de Estado e ministro no Governo de António Guterres (1995-2000) foi proposto pelo seu ministro das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos.

Desde o início, o engenheiro José Sócrates instou-me a que demitisse a administração da Caixa Geral de Depósitos e nomeasse Armando Vara, afirmou, no julgamento da Operação Marquês, Luís Campos e Cunha, precisando que a pretensão seria que Carlos Santos Ferreira viesse a ser designado presidente e Armando Vara vice-presidente.

O ministro de Estado e das Finanças entre Março e Julho de 2005 ressalvou que tal não era ilegal, mas sustentou que havia considerações de carácter ético a ter em conta e não queria “arranjar jobs for the boys [emprego para os amigos do partido].

Na acusação, o Ministério Público defende que José Sócrates e Armando Vara, que acabaria por ser nomeado administrador da CGD no final de 2005, foram subornados num total de dois milhões de euros por dois investidores do resort algarvio de Vale do Lobo para beneficiarem o empreendimento de luxo.

A imputação baseia-se no pressuposto de que Armando Vara foi indicado para a administração por instrução de José Sócrates, uma alegação que, na sessão de 4 de Setembro do julgamento, o antigo primeiro-ministro contrapôs ser falsa.

Hoje, Luís Campos e Cunha sublinhou que não tinha uma opinião nem boa nem má sobre Armando Vara, tendo José Sócrates chegado a marcar um encontro entre os dois para que se conhecessem.

Quando Carlos Santos Ferreira foi nomeado presidente do banco público e Armando Vara administrador, o ministro das Finanças do antigo primeiro-ministro socialista (2005-2011) era Fernando Teixeira dos Santos.